STF define regra para vigência de cortes no Reintegra
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em julgamento encerrado no Plenário Virtual, que alterações nas alíquotas do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para Empresas Exportadoras (Reintegra), só entram em vigor 90 dias após a publicação do decreto que as institui. A decisão, com repercussão geral reconhecida, teve oito votos favoráveis à noventena e três contrários.
A análise teve como base o Recurso Extraordinário (RE) 1285177, de relatoria do ministro Cristiano Zanin. A tese firmada afasta a aplicação da chamada anterioridade anual e define que a anterioridade nonagesimal (prazo de 90 dias) deve ser observada em mudanças que impliquem aumento indireto de carga tributária.
A decisão evita um impacto estimado de R$ 4 bilhões aos cofres públicos, valor previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em caso de reconhecimento da anterioridade anual, o que permitiria aos contribuintes recuperar créditos por até um ano.
Vale lembrar que o Reintegra foi criado em 2011 e reinstituído em 2014, o Reintegra foi concebido para restituir parte do resíduo tributário acumulado ao longo da cadeia produtiva de bens destinados à exportação.
Inicialmente, o programa permitia a devolução de 0,1% a 3% da receita de exportação. No entanto, sucessivos decretos presidenciais reduziram esse percentual. Em 2015, o índice foi cortado para 1%, subindo depois para 2%. Em 2018, nova alteração reduziu o valor a 0,1%, patamar que permanece em vigor.
Essas mudanças geraram controvérsia no setor produtivo, que alegava prejuízo à previsibilidade e à competitividade das empresas exportadoras. A principal discussão jurídica girava em torno do prazo para entrada em vigor dessas alterações.
Decisão do STF reforça anterioridade nonagesimal
A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, ministro Cristiano Zanin, que considerou o Reintegra um benefício fiscal na forma de subvenção econômica. Zanin citou precedentes da própria Corte, como as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6040 e 6055, e o Tema 1.383 de repercussão geral, que trata de regras de anterioridade em casos de majoração indireta de tributos.
Segundo o entendimento consolidado, a redução ou supressão de incentivos fiscais que resulte em aumento indireto de carga tributária exige a observância da anterioridade nonagesimal, mas não necessariamente da anual.
“O Reintegra tem natureza jurídica de benefício fiscal, e a alteração de sua alíquota configura majoração indireta da carga tributária. Por isso, deve respeitar a noventena”, afirmou Zanin em seu voto.
Impacto da decisão no caixa da União ainda é incerto
De acordo com o procurador da Fazenda Nacional, Euclides Sigoli, ainda não há estimativa precisa do impacto financeiro da decisão para a arrecadação federal, mas o entendimento é positivo para a segurança jurídica.
“A decisão é coerente com a jurisprudência do STF, com a expectativa que havia sobre o tema e com o padrão já adotado pela Corte em julgamentos anteriores”, avaliou Sigoli.
Especialistas em direito tributário também veem a decisão como um marco importante na delimitação dos efeitos de cortes em benefícios fiscais. Para o setor exportador, a principal consequência é a possibilidade de manter, por pelo menos três meses, os percentuais antigos do Reintegra sempre que houver redução por decreto.
Advogados veem avanço, mas apontam lacunas
A sócia do FH Advogados e representante da empresa contribuinte no processo, Flávia Holanda Gaeta, argumenta que a decisão deveria ter aplicado também a anterioridade anual, conforme tese fixada no próprio Tema 1.383.
“Os contribuintes foram surpreendidos por mudanças abruptas. A aplicação da anterioridade anual daria mais segurança jurídica, pois garantiria que alterações só valessem a partir do ano seguinte”, explicou.
Para o advogado e sócio da Advocacia Dias de Souza, Daniel Szelbracikowski, a decisão reconhece que o crédito do Reintegra é instrumento operacional de uma política pública.
“Não parece adequado restringir o alcance da norma desonerativa de forma imediata, sem prazo mínimo de transição”, afirmou.
Contribuintes poderão recuperar créditos de períodos anteriores
Com a decisão do STF, os contribuintes têm respaldo para reivindicar créditos referentes aos 90 dias seguintes aos decretos que reduziram o Reintegra, especialmente nas alterações de 2015 e 2018. Segundo a tributarista Talita Santana, essa possibilidade pode representar um alívio financeiro importante para algumas empresas.
“Agora há jurisprudência clara. Empresas exportadoras que recolheram tributos com base em alíquotas reduzidas nos primeiros três meses após os decretos poderão reaver a diferença”, explicou.
A recuperação de créditos, no entanto, dependerá de análise individual de cada situação, especialmente em relação à documentação fiscal, escrituração contábil e prazos de prescrição para pedidos administrativos ou judiciais.
O que muda para contadores e empresas exportadoras
A decisão do STF reforça a necessidade de planejamento tributário constante por parte das empresas exportadoras. Profissionais da contabilidade devem acompanhar decretos que alteram benefícios fiscais e orientar seus clientes quanto aos prazos de vigência e possibilidade de recuperação de créditos.
A atuação preventiva é fundamental para evitar perdas financeiras e para garantir o correto aproveitamento de incentivos fiscais disponíveis. No caso do Reintegra, conhecer os efeitos da noventena permite ajustes estratégicos nas operações de exportação e no fluxo de caixa das empresas.
Reintegra e segurança jurídica no ambiente tributário
O julgamento do STF sinaliza uma maior proteção à segurança jurídica no campo tributário, ao estabelecer que alterações que resultem em majoração indireta de tributos devem respeitar prazos mínimos.
A medida também delimita a atuação do Poder Executivo ao alterar unilateralmente regras fiscais por meio de decreto, exigindo previsibilidade mínima aos contribuintes.
Especialistas sugerem que decisões semelhantes podem ser adotadas em outros casos envolvendo a redução de benefícios fiscais federais, como créditos presumidos, isenções e regimes especiais de apuração.
Com informações do Valor Econômico
Data: 26/05/2025
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